sexta-feira, 1 de maio de 2020

poema de amor, sério

ele pediu que eu tirasse a roupa
devagar, ele disse, devagar 
tudo acontecia pela internet 
quando ele me beijava
fazia um som específico 
e eu imaginava a boca
dele como veludo azul
ele pediu, agora, grava
devagar, ele disse, devagar
e vai mostrando tudo 
enquanto você tira
a roup a
quando ele descia a mão
pela virilha dele
fazia um som e eu
imaginava o toque
como camurça rosa
trocando as cores
ele diz devagar, bem devagar 
coloca o celular na boca
diz que me ama
assim de longe e deva
gar 
quando eu imagino ele
do outro lado 
escuto um som específico 
linho esverdeado 
as mãos dele batendo contra
a virilha roçando 
o pelo esverdeado 
rosa esverdeado 
rápido e devagar 
rápido e devagar 
as roupas no chão do banheiro 
eu e o espelho ele
do outro lado
devagar desliga a câmera
diz que me ama
ainda e as palavras
batem no vidro azul sem cor

domingo, 29 de dezembro de 2019


é fácil sentir pena de si
o mundo nessa roda frágil
te parte ao meio
te larga aos pedaços
e você crê que há uma dívida
e que há uma metáfora
mas não, palavras como frascos
alquímicos vazios
não saciam o desejo
que em nós habita e
a cada dia fere
é difícil querer do mundo
um pedido de desculpas
quando nos perdemos
mas assim seguem os dias
como porcelanas manchadas
de borras de café
que mal interpretamos

domingo, 24 de novembro de 2019

Cruzada satanista


O que vocês esperam de um sábado à noite,
o que popularmente se chama de “fome”.
Abrir os olhos: procurar chifre em cabeça de cavalo
e encontrar

Sagitário


Estamos todos procurando
um bálsamo para a ferida que não cura
ainda que o instinto seja
deixar gangrenar.
Quando olho para o céu me lembro:
Estou odiosamente preso ao chão

domingo, 17 de novembro de 2019

rising


separo minha metade mar
minha metade terra
separo com peixeira
sem dó ou piedade
não olho ninguém nos olhos
e quando durmo não sonho
separo tudo: as roupas
por cores os sapatos
por ocasião os amores
e quando durmo não sonho
mesmo
quando acordo
visto os olhos novos
e minto extensivamente

sábado, 28 de setembro de 2019

O papa e o monstro



As tardes de sábado caíam como uma luva
Ou um meteoro, lembrou de assistir na tv
Desenhos em que as mensagens
Só se descobre na vida quase adulta
Quando nada acontece e você vira o relógio
E quando descobre o Diabo e as correntes
“que não te prendem, não te esmagam”
Dizia teu conselho
Quando acha que a liberdade é só minha
Para conquistar nesse sábado morno
Em que o único acontecimento foi
Olhar aqueles homens tristes no tinder
Mirando a tristeza de quem reflete
Como se caminhássemos nus mas ainda
Tivéssemos receio e colocássemos as mãos
Sobre o pinto
Ah como se ninguém visse pinto!
Ou pensasse em pinto
Ou fantasiasse o pinto do ator na tv
Como se ninguém soubesse que a liberdade individual
É algo inato e perigosamente explosivo
Como o abraço que neguei no passado
Na juventude rebelde, a contragosto
Como o desejo que aquietei e sorri
A contragosto na festa de família
Ah como é cafona tudo e como é cafona,
Na juventude, dizer que nada presta
E que não se gosta de gente
E que a tecnologia é o mal do século
Ah como é tão sexy fingir não amar
E ter o coração como um órgão apenas
E transar sem tesão só pra gozar
E depois de gozar guardar o pinto
Com vergonha na calça
Rezar a missa diária, os pés invertidos
Eu ouço teus conselhos como bombas
Eu protejo meu peito como aquário
Eu olho lá fora e como me arrependo
De não ter sido tão patético
Como aqueles homens
Com os pintos tão tortos ao vento
Realmente uma imagem patética
Um pinto torto
Saudando o vento



segunda-feira, 9 de setembro de 2019

agora é jogo de matar ou morrer 
crucificar o mais forte da manada 
abraçar a estrutura sem temer 
o frio do passado 
agora é jogo de rainhas e papas
coroar o coração sangrando 
decorar o coração com espadas 

não abro à mesa nenhum oráculo 
não esqueço do olho 
ou do corpo inventando 
o gesto que te acompanhava 
nada de destino existe no homem 
nada de destino existe no homem 

e então o que há entre 
a espada e o ventre?
não são os cavalos 
que você esculpiu na areia do tempo 
não são os demônios 
que nos esculpiram 
o que há entre a cabeça 
e o coração 
é a palavra 
fazendo as pontes 
mal construídas 
das inseguranças 

o que há 
religiosamente falando
que o pecado é um desvio na comunicação