quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

poemas para quem

I.

empilhada ao lado da geladeira
uma memória tua
com seu cabelo castanho
de colorir figuras
é uma nova emergência, essa
a de reestabelecer
sua memória nos cômodos
mais frios da casa

II.

todos os aparelhos eletrônicos
estão desligados
eu estou sentado no sofá
lendo uma fotografia tua
desde que você chegou
no poema
fiz uma lista dos
objetos em que te escuto
aqui em casa
- no corrimão da escada
- no ranger no piso de madeira
- nas molas do sofá
- na geladeira descongelando
- no interfone a tocar sozinho às 5 da manhã

III.

você este som abafado
que corta a casa
a casa do poema, entreaberta
aqui entre os monitores
velhos desligados
lendo as tuas fotografias
como num epitáfio
aqui jaz
e no meio de tudo
teu rosto nas palavras
colado

IV.

você ainda existe
duas vezes
janela, reflexo, olho
o jogo é quem
verá mais longe


V.

quem vai cortar no vidro
o primeiro caco

VI.

a memória é tanto
sua quanto minha
ao lado da velha geladeira
colecionando nomes
de coisas que não
propriamente pertencem
a qualquer corpo
isso de sentir tua falta
em cada cômodo
isso de ler tuas fotografias
isso dos sons e aparelhos
eletrônicos todos
a malfuncionar
isso de te botar aqui
vivo em um poema
que você não vai ler 

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