segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Um tiranossauro da cor dos teus olhos

 I.
arqueologia nossa
de cada dia
(o limite da tua orelha
coberto de relvas)

voltam os arqueólogos
mas não voltam
as cidades perdidas
os beijos dados
atrás das casas
o animal
metamorfo
que ninguém soube
nomear

:o corpo do passado
não volta mais
as algas que
decoravam sua entrecoxa
os beijos de rã
roubadas
do córrego que ninguém
mais conheceu
- saudade
é o que podemos ter
- saudade
é o que te traz mais
perto
- saudade
é a palavra mais
erótica
(ossadas sem sentindo
enterradas
no nosso quintal)

II.
imaterial é o meu corpo
sem desejo
esculpindo na
mesa molduras sem
retrato
imaterial é a minha mão
direita
da palavra
a fome

(as paredes não tem
fotos nossas
o reboco pode ser
esconda
alguns retratos
manchados
mas é atrás
bem atrás
na estrutura mínima
de algum elemento
químico
que se esconde
o teu olho castanho
:primeiro tiranossauro)

III.
o movimento da escavadeira
é altamente sexual
me dizia ela
em francês
o que fazia tudo
soar ainda mais erótico
não só poeticamente
também de um ponto
de vista da psicanálise
eu dizia em português:
é então as coisas
se complicaram
minha primeira escavação foi
quando botei
minhas mão por baixo
da calcinha
dela e estourei uma tubulação
delicada
ela diz e fuma um
cigarro dos mais clichês
quando pergunta a mim
digo que não
tenho o costume de
escavar perto
das tubulações que ela
tanto aprecia
qualquer um pode desenterrar
um cadáver com as mãos
a qualquer momento
:o movimento da escavadeira
é altamente amoroso
e ela leva minhas mãos
para passear
em um sítio de construção
me diga,
qual era o teu dinossauro preferido?

IV.
poemas sobre dinossauros
viagens ao passado
ao futuro de
algum planeta ainda
primitivo
:quem garante não estarmos
hoje perto
de uma nova
era jurássica?
ele me dizia que via
vales de neon
repletos de ossadas
e que adorava
colocar a boca de leve
contra as intersecções
que faziam
os sons, as cores e os
rugidos
ele me dizia que
a primeira vez
em que eu mordi a costela
dele era
como um cifre de triceratops
que a minha
barba na nuca dele
era como os dentes finos
dos velociraptors
eu disse a ele
:nomes de dinossauros
não soam bem
em um poema
ele me disse que
nada soa bem em um poema
porque o poema é sempre
a representação pobre
de um ecossistema impossível
nada soa bem
no poema exceto
os sons que fazem
os dinossauros 

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