hoje passou um
bicho lá fora
dizendo que é o
fim
do nosso tempo
Marília, me
perdoa
porque eu
esqueci da sede
e você me
pergunta
como
que a sede
esquece
da água?
Marília eu estou
aqui
de fora do mar
com os pés para
o alto
do céu seco
sem saber
responder nada
que me perguntam
nome, idade,
estado civil
e o que eu sabia
sobre filtrar o
sal
e tapar o sol
eu não sei mais
pois bem Marília
não é outro
tempo
de mentiras
e quando você
voltar
com as contas na
mão
e os pés sujos
de terra
e me disser com
a voz
grave
já
se sabe notícias tuas?
vou dizer
que fui aos
prantos
procurar conchas
no quebra-mar
eu nem gosto
tanto
do mar Marília
eu tenho tanto
medo dos
tubarões
e daqueles
peixes
venenosos
que parecem
pedras
e Marília
você já pisou
naqueles peixes
venenosos que
parecem pedras?
será que um dia
vamos
poder caminhar
sem temer sempre
pisar
em pedras e
peixes
venenosos
e me diga que
espécie de
peixes somos
nós que bebemos
água até
engasgar e
fingimos
respirar ar
e mentimos sobre
ter ou não essas
escamas
Marília você é
uma tilápia
uma traíra
um lambari?
qual será esse
nosso destino
você
acredita em destino?
será que ele é
um peixe
e será que a
gente
pisa nele e
pensa
que tem veneno,
Marília?
eu tenho pensado
que eu corro
demais
suo demais
penso demais
em coisas que
não devo
imagina só se
esse peixe que
a gente pisa
a gente também
põe na boca
e espeta na
língua e
na cabeça e
espeta no dedão
da mão
parece uma
estranha
estupidez isso
não é
Marília?
mas talvez
sejamos
estúpidos mesmo
nós que pisamos
no mar sem saber
nadar
e reclamamos aos
nossos pais
que nos
afogávamos
mas ora
é
uma questão de lógica
e nós sabemos
tão pouco
sobre a lógica
Marília
e então pensamos
que nadar no mar
fosse como que
andar
e respirar
e comer peixe
na casa da tia
no Rio de
Janeiro
que são coisas
que
Marília são tão
simples de fazer
mas é a lição
foi aprendida
mesmo assim
você ainda tem
medo
dessa água
funda?
e você ainda
percebe
a sensação que
se tem no nariz
depois de tomar
um caldo?
Marília um caldo
é uma coisa
tão natural
quando
um mergulho
somos nós que
tanto tememos
nos afogar
de novo e pisar
de novo naquela
pedra
peixe
pedra venenosa
e assim a
memória
que é essa
escama esse veneno
ela pisa na
gente
e diz
cabe ter medo
do mar
mas olha Marília
hoje já é dia 31
amanhã é outro
ano
e eu começo a
pensar
que já estamos
tão sem jeito
mas que ainda é
tempo
de esquecer tudo
que sabemos
sobre o amor
e sobre pedras
e sobre peixes
e sobre veneno
e sobre tanto
Marília me dá a
mão
e nós vamos
juntos
tirar os pés
da areia
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