domingo, 18 de dezembro de 2016

cláudia ou um poema sobre o ano novo

Cláudia, as cartas não mostraram nada de novo
parece que esse próximo ano
será ainda como que os peixes
que hoje se vendem nos mercados
e que tem aquele gosto
extremamente doce
e eu acho que nós temos disso
de não gostar desse sabor doce
que fica esquecido no canto da boca
e que repete o tempo todo
um padrão uma cor uma lembrança
ah Cláudia esse ano foi um pouco
uma lembrança
e foi um pouco como se é triste
quando criança se descobre
não poder aprender truques de mágica
mas pelo menos temos
aceitado um pouco como as coisas
mudam
e temos tido paciência
com aquelas samambaias
que nunca crescem apesar de
sempre se anunciarem com muito ardor
temos posto as nossas mãos
pra fora da janela Cláudia
com muito cuidado
certos de que o vento lá fora
carregaria um ou dois elefantes
mas pelo menos temos aberto as janelas
e temos até nos esquecido
de que comer peixe nos deixava
com um gosto pela nostalgia
e então temos comido
sem saber do futuro
e sem se preocupar que os peixes
tem longos espinhos doces
e que nosso estômago é fraco
e digere tudo tão devagar
eu aprendi Cláudia que devíamos
esquecer mais
e desatar esse compromisso com a memória
e eu lhe digo com alguma
pouca e fraca certeza
de que isso de tentar lembrar é atoa
e que mesmo que nós continuemos
a lembrar todo santo dia
os peixes ainda engolem barras de chocolate
e as samambaias fingem crescer
e o vento lá fora zomba da nossa cara
é Cláudia eu acho que isso
não depende da nossa memória
e talvez as cartas sirvam apenas
pra ser esquecidas
e então relembradas
como que numa surpresa
é por isso que ano que vem
devíamos fazer um esforço
pra esquecer das samambaias
e engolir os peixes
e botar toda a cabeça
de fora da janela
devíamos tanto fazer esse esforço
de esquecer do tempo
e lembrar das coisas somente
quanto elas existirem 

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