abro o caderno
pra escrever um poema enquanto te espero na segunda
o poema não sai
mas ainda é cedo
eu penso
porque ele vai
demorar
como sempre
demora e como
sempre vem
dizendo
o
dia tá apertado
eu devia comprar
um maço de
revistas de
consultório
eu penso
pra fingir que
leio
olhar as fotos
das famosas dos
vestidos
das famosas
e jogar para o
lado
se tiver seção
de piadas
eu paro
não acho graça
não acho mais
graça em nada
fecho o caderno
pra ver se você
vem
olho o celular
sua mensagem diz
estourou
a guerra em Tróia
tive
de partir
vai
tecendo um manto, Penélope
pra
te distrair
e este é seu
último conselho
depois de te encontrar
na terça
descemos a
ladeira sem jogos de linguagem
atravessamos a
rua
eu te dei um
beijo de despedida e você
foi pra casa e
você cozinhou algo
desde então
já usei uma fita
azul no cabelo como
sinal da mais
bonita calma
sem jogos e sem
respostas
eu na espera brinco a língua
porque é isso o que eu tenho que você
não toma
o meu manto que
costuro
e os meus
vestido azuis de veludo
te espero desde
que desci a
ladeira decidindo
que deste dia em
diante não diria mais nada
mas meu fraco é
esse
não sei jogar o
jogo
em que você
ganha
e estou tão
perto do celular
pra pegar e te
escrever
que hoje eu
fiquei
um pouco com seu
cheiro
e que isso de
esperar
a gente tenta
preencher
com a língua
e o tempo geme
quarta é o dia
eu sentado
embaixo de uma árvore
colhendo as merrecas
que são as
recompensas
dos que esperam
quando você vem
desfaço meu
manto
pela metade
quando você vem
eu
por algum motivo
me lembro
de dinossauros
quando você vem
o Papa
Mickey e um
corredor manco
todos sorriem
porque
você chegou
seria tão rude
da minha parte
se eu não
sorrisse também
na quinta eu
sempre acho que você esqueceu
e botei pra
tocar Roberto Carlos
Lupicínio e
Alcione
como dói
vou furando os
dedos
costurando
minha manta
e choro
e torno a reclamar
com os
pretendentes
ele
disse que voltaria
espero por notícias
de Ulisses
será que em
Tróia não
pega 3g?
na sexta eu nego
os arquétipos
Penélope foi ao
Egito e pediu a Aladdin
uma dica
preciosa
transformaria
seu manto
em um tapete voador
vai Penélope
virar o mundo
do avesso
sem mais esperar
sem mais
procurar no Google
que horas acaba
a maldita guerra
em Tróia
mas quando estou
na beirada
da montanha
um pé no ar e um
pé
na rocha
você me liga
me
distrai no papo
Circe
me ofereceu uma cerveja
eu
esqueci do tempo mas
já
estou indo a te encontrar
sábado eu não
espero mais
lição da espera:
uma hora ela tem que acabar
não é só sobre
fugir
pro mar com meu
tapete mágico e
esquecer
nós não vamos
fazer do mar
a fuga
eu e Penélope vamos
pro Caribe
tomar banho de
sol
trocar as mantas
por um biquíni
e fumar charutos
caros
demais
charutos caros
demais
domingo você
volta?
Penélope e eu
fizemos três anos
de terapia e
descobrimos
que não há
Ulisses
que valha a
espera
saímos a procura
de novos hobbies
dança
contemporânea
hip-hop e
artesanato
pra nos ocupar
dessa maldita
voz na nossa
cabeça
:uma boa Penélope espera
espera
boa e espera doce
espera
inerte sentada
costurando
sua manta
quando
Ulisses volta ela
chora
de alergia
ele
já não é mais como antes
ela
tem artrite
ele
conhece tantos lugares
ela
permaneceu na varanda
depois
de alguns
meses
ele a julga burra
e
a troca por uma Penélope
quinze
anos mais nova
no domingo eu me
olho no espelho
meus cabelos longos
até
o umbigo
eu pergunto a
Penélope
uma direção
ela me aponta o
mar
me aponta Tróia
diz que meu
destino
é esse
pegar de volta
tudo
aquilo que você
levou
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