Maria quanto eu
lhe devo?
veja há certa
urgência
no ar
ultimamente
há uma vontade
seca
de escrever
bilhetes
em papeis
e colá-los na
geladeira
eu acho que
perdi o ponto
perdi o ônibus
sentei na janela
errada
ah Maria que dia
quente
que ar mais
úmido
que olho roxo o
nosso
é uma enxaqueca
tão longa
pra um dia tão
curto
e isso é tudo
que tenho
sentido, eu sei
que falta de
emoção
não é mesmo
minha amiga?
passo horas em
meu quarto
publico fotos
procuro coisas
que não fazem o
menor
sentido e penso
que o tédio me
deixou
sem graça
Maria eu não rio
mais
de nada
e quando rio
parece falso
me contento em
ver
cenas engraçadas
e rir por dentro
ora
quando foi
que começamos
a rir por
dentro?
isso é tão
triste
eu estou a
marcar
a hora que passa
o trem na
ferrovia
toda noite e
isso
é tão triste
me diga agora
como funciona
isso de ter
fé
pois eu temo que
tenha me tornado
um cético
ou um cínico ou
um miserável
Maria
eu deveria me
lembrar
mas eu não sei
do que
ora eu tenho
sido
um perfeito
pessimista
eu tenho
guardado
um rancor tão
grande
tenho escrito
mentiras
em papéis
que grudo na
geladeira
depois finjo ler
com um sorriso
mas bom agora
que eu já disse
são mesmo
mentiras
a verdade Maria,
ela
eu não saberia
escrever
e se escrevesse
talvez não
soubesse
ter escrito
droga nós
estamos
mesmo no caminho
pra nos tornar
aqueles
parentes que se
casam
aos trinta e
dois
e dizem sempre
que não deviam estar casados
e gritam com os
filhos
e traem os cônjuges
isto é cruel
Maria
o jeito como nos
tornamos
tão céticos
o jeito como não
falamos disso
o jeito como
desistimos
e achamos
que é bom
desistir
porque no fundo
é o jeito mais
fácil
eu estou sendo
sincero com você
Maria
mas isso é raro
e eu me pergunto
quando foi que
isso
começou?
quando foi que
nós
deixamos isso
acontecer?
e me lembre
por fim
quanto é que eu
lhe devo?
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